SYRAH

Degustação técnica dia 20/09/2014

Tivemos o privilégio de receber mais uma vez em nossa confraria nosso ex-companheiro Murillo de Albuquerque Regina, engenheiro agrônomo e especialista em viticultura, com PhD na Universidade de Bordeaux, na França, pesquisador da Epamig – Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Caldas – MG), que nos brindou com esta degustação, organizando e coordenando a mesma. Degustamos vinhos que ainda não foram lançados no mercado para comercialização, os chamados “Vinhos de Inverno”, ou seja, vinhos elaborados de uvas colhidas no inverno, condição esta possível graças a técnica da dupla poda ou inversão do ciclo da videira.

 

Para quem não conhece bem essa história, seguem abaixo as informações necessárias.

 

Histórico: Murillo de Albuquerque Regina, enólogo pesquisador da Epamig, foi o primeiro a aplicar a técnica da dupla poda, que altera o ciclo natural da videira. Inspirado pelo botânico francês Auguste Saint Hilarie, que em 1819 atravessou as montanhas do sul de Minas Gerais, Murillo acreditou ser possível elaborar vinhos de qualidade na região sudeste. Há praticamente dois séculos, ao percorrer as nascentes do rio São Francisco, Saint Hilarie registrou em suas anotações “a notável superioridade das uvas colhidas no inverno com relação às do verão”. Os testes se iniciaram em Três Corações em 2001, na fazenda de nosso companheiro Marcos Arruda Vieira, em Três Corações, sul de Minas Gerais. Contemplaram as uvas Syrah, Cabernet Sauvignon e Merlot. A Syrah mostrou melhor desenvolvimento e produção. Outra casta também bem adaptada foi a Sauvignon Blanc. Com resultados encorajadores no campo, Murillo convocou seus dois sócios numa empresa de produção de mudas de videiras, os franceses Patrick Arsicaud e Thibaud de Salettes, do Vale do Rhône e Pirineus, e junto com Marcos Arruda Vieira, fundaram em 2007 a Vinícola Estrada Real. Três anos mais tarde surgiu um vinho pioneiro, o Primeira Estrada Syrah 2010, com passagem de 12 meses por barricas de carvalho francesas (70% do vinho) e americanas (30%) e um ano de garrafa, com produção total é de 10 mil garrafas. Em breve será lançado também um Sauvignon Blanc.

 

O que é a dupla poda ou inversão do ciclo da videira ?

A experiência de inversão do ciclo da uva já rendeu a Murillo uma tese de mestrado, duas de doutorado e artigos em publicações especializadas, como na alemã “Vitis”, uma das principais revistas científicas de viticultura. Anteriormente, a dupla poda era realizada somente com a intenção de adaptar a colheita de uvas de mesa à demanda do mercado. Em todo o mundo, o ciclo da uva é parecido: poda no inverno, colheita no verão. Contudo, na maioria das regiões vinícolas brasileiras, o período de colheita das uvas coincide com a época de maior intensidade de chuvas, o verão, condição que afeta negativamente a qualidade dos vinhos obtidos, em especial a dos vinhos tintos. A ocorrência de dias chuvosos ou com alta nebulosidade, aliada as temperaturas ambientais elevadas prejudica não só a maturação das uvas, mas também a sua sanidade devido à ocorrência de inúmeras doenças fúngicas nos cachos. Um dos maiores desafios da viticultura brasileira é justamente identificar regiões onde existam condições climáticas ideais para o bom desenvolvimento da Vitis vinífera, espécie de videira exclusivamente utilizada para a produção de vinhos finos. A região do sul de Minas Gerais é uma dessas regiões. As melhores regiões produtoras de vinho no mundo (Mendoza na Argentina, Piemonte na Itália, Maipo e Aconcágua no Chile) reúnem as mesmas condições climáticas, na época da colheita, encontradas no inverno do Sul de Minas Gerais: altitude (aqui 800 a 1000 metros), solo argilo-arenoso de boa drenagem, dias ensolarados, baixas temperaturas à noite e pouca chuva. Cada um desses aspectos determina a qualidade do vinho. O dia claro influencia no açúcar acumulado nos cachos: dias nublados, baixa fotossíntese, pouco açúcar; dias claros, alta fotossíntese, mais açúcar. As baixas temperaturas noturnas, por sua vez, favorecem a síntese e acúmulo de polifenóis, que ditam a intensidade da cor do fruto e a produção de tanino, substância essencial para uma boa estrutura do vinho. Já a baixa umidade é importante porque evita o aparecimento de doenças, como a podridão dos cachos. Sem chuva também há uma maior concentração de açúcar na uva, maior teor alcoólico, mais corpo, taninos mais presentes, maior concentração de aromas. A maturação é mais intensa quando a falta de água ameaça a uva. Por um mecanismo natural de sobrevivência, a videira manda todos os nutrientes para o cacho, um processo que visa a proteção e o desenvolvimento do envoltório das sementes, a uva. Mas para fugir da chuva na colheita é preciso investir na inversão do ciclo da videira, fazendo um manejo de podas diferenciado, para que a planta possa frutificar no inverno. Basicamente são feitas duas podas: uma em agosto e outra em janeiro. A primeira em agosto é feita para a formação de ramos produtivos. Em janeiro, faz-se a poda efetiva de frutificação. A planta então começa a brotar em fevereiro, floresce em março, e em abril os cachos começam a se formar. Nas regiões vinícolas do sul do País, alterar o ciclo da videira não é possível em função das baixas temperaturas dos invernos. Nas regiões do Nordeste, com temperaturas excessivamente altas, não ocorre a amplitude térmica entre noite e dia. Essa é a vantagem do Sul de Minas Gerais. Além de Minas Gerais, a Epamig tem apoiado outra iniciativa de produção de vinhos finos em andamento na cidade de Espírito Santo do Pinhal, interior de São Paulo. Esse projeto já possui área cultivada de 50 hectares de videiras européias e orienta-se à elaboração de vinhos tintos, brancos e espumantes, com alta tecnologia tanto no manejo do vinhedo quanto na vinícola, que já se encontra instalada.

 

Vinhos Degustados: Degustamos três vinhos Primeira Estrada produzidos em Três Corações – MG, dois deles safras 2011 (barricado e não barricado), que ainda não foram lançados no mercado para comercialização, e um safra 2010 que já encontra-se comercializado; o vinho Vistas da Serra 2011 produzido em Espirito Santo do Pinhal – SP, que também ainda não foi lançado no mercado; e o Alma Única 2011 produzido na Serra Gaúcha – RGS.

 

- Primeira Estrada Syrah 2011 (não barricado): rubi, aroma fechado, alho, químico. Na boca tânico, média persistência.

- Primeira Estrada Syrah 2011 (barricado): rubi, aroma de frutas vermelhas. Na boca taninos marcantes, boa acidez, longa persistência, equilibrado. Um vinho muito bem estruturado com grande potencial de evolução. Muito bom.

- Vistas da Serra Syrah 2011: rubi, aroma de frutas vermelhas, baunilha, coco. Na boca taninos macios e aveludados, longa persistência, muito equilibrado. Um vinho excelente.

- Alma Única Syrah 2011: clarete, aroma de especiarias, couro, café. Na boca corpo médio, pouco tânico, boa persistência, leve amargor, equilibrado.

- Primeira Estrada Syrah 2010: rubi com reflexos violáceos, aroma de frutas vermelhas, café, baunilha. Na boca taninos macios e delicados, boa persistência, muito equilibrado. Muito bom.

Esta degustação serviu para diferenciarmos com muita clareza o que é um vinho elaborado a partir de uvas colhidas no inverno (mais cor, mais aromas, mais taninos, mais corpo) e um vinho elaborado de uvas colhidas no verão chuvoso, que também tem suas qualidades.

 

  • Após a degustação foi servido o seguinte jantar
  • Entrada: Alcachofra recheada;
  • Principal: Peito de frango recheado com cogumelo Porto Belo, Polenta mole e Aspargos;
  • Sobremesa: creme de papaia.

 

Vejam as fotos desse evento !!!!!!